sábado, 14 de janeiro de 2012

Filme pornô falado

Ela me contou tudo, com todos os detalhes, e alguns bônus extras. A narrativa era de filme pornô com história, desses que não existem mais, porque o espectador não tem paciência para preliminares. A introdução já é a introdução. Mas ela tinha um bom texto para a lengalenga que precede a trepada – a dela, no caso.

Naquela noite sem muito assunto não era pior coisa do mundo. A narradora seria igualmente sexy se ela estivesse recitando a lista telefônica ou o Guia 4 Rodas. Mas o papo era XXX. O rosto lindo se transfigurava de acordo com as cenas e houve até linguinha de fora para reforçar obscenidades do enredo. Pensei em oferecer-me como ator coadjuvante, mas senti em tempo hábil que a estrutura da composição era o monólogo. Poderia estragar a mise en scène e nossa amizade recente.

A moça seguiu cada vez mais omnisciente, manipulando o tempo e devassando o interior de seu personagem e de si própria. Custou um pouco até chegar ao elevador e a seu objeto: homem musculoso e simpático, recém-chegado ao apartamento do lado, a aparição mais bela do condomínio desde sua construção em 1992, segundo ela. Até chegar ao 16 º, olhares se alternaram entre o teto e o escaneamento mútuo de corpos. Depois, novo encontro, na piscina do prédio e, para encurtar a história – a minha, não a dela -, encostadas sutis, afagos, beijos, amassos, arremesso de calcinha e cueca e, pluft, rolou. Uma noite inteira de gemidos e gritos ecoando na vizinhança, quiçá no bairro.

Esse meio tempo, no entanto, foi rico em minúcias: períodos de maior lubrificação, posições mais cômodas, palavras apropriadas para a ocasião. Em dado momento, a moça abriu um travessão ou aspas – não conheço seu estilo por escrito – e passou a soltar sua fala impudica, cheia de “ais” e “uis”, num ritmo cada vez mais alucinante, até um desfecho explosivo e verossímil. Fiquei com taquicardia.

Mais tarde, ela confessou: era tudo mentira.

- Só queria diverti-lo um pouco. Você anda tão entediado.

Um comentário:

R@quel Rocha disse...

parece que funcionou, kkkk (Que leitura maravilhosa! Leve, engraçada, instigante. Adoro textos assim.)

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