quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Der prozess

Um desafio gigantesco para um artista de tantas bienais e instalações. Seu último trabalho, neste mundo ecumênico das artes plásticas, seria matar-se e, em seguida, ter o próprio corpo escondido por um mecanismo acionado post-mortem. Uma realização de fino gosto para retirar-se de cena com algum alarde nas editorias de cultura.

A máquina é complexa e funcional. O engenho, em si, tem seus méritos. Mas o esquema conta ainda com programas de computador capazes de disseminar pistas falsas e uma competente assessoria de imprensa. O processo do adeus – ou Der prozess, como o artista prefere - tem alta tecnologia, soluções criativas e, acima de tudo, charme. Falta apenas um patrocinador disposto a polemizar. Algumas marcas estudam o impacto de tão performático suicídio em seus pontos de venda.

Já os críticos estão abismados – bom sinal - e nenhum deles ousou um texto condenatório. Querem ver o resultado estético para depois escrever sobre o assunto. Ninguém fez comentários sobre o lado mórbido da morte porque não cairia bem a um crítico tamanho lugar comum. Do mesmo modo não esperam uma alegoria sobre o fim da arte. Óbvio demais.

Quanto ao artista, ele segue em simulações. Está bastante animado com a proeza e o fato de não poder repeti-la em Kassel, por razões inequívocas, não lhe tira o sono. Será um espetáculo único, transmitido por redes sociais, “uma coisa pra cima”, com diz um de seus mais auxiliares mais próximos. Claro que está fora de questão qualquer vínculo obra-autor. Ele não está deprimido ou insatisfeito com a vida. Pelo contrário. Quer tocar num extremo da arte, ir aonde nenhuma outra auto-instalação chegou. A graça não é simplesmente morrer – é esconder o corpo. Lúdico, não é mesmo?

terça-feira, 29 de novembro de 2011

O cheiro

Dos sentidos, o cheiro e o tato são os mais desprezados. Os restantes são contemplados até com críticos. Há críticos de música (audição), cinema (audição e visão), artes plásticas (visão), teatro (visão e audição), mas não existe – pelo menos não conheço - um famoso crítico ligado ao univers do cheiro ou do tato, no caso específico dos adores, um especialista em senti-los e transformá-los em palavras. Não se trata apenas de alguém que tenha escrito sobre o assunto, como Patrick Süskind, em O Perfume. O que faz falta no meio das artes é uma Pauline Kael ou um Humberto Eco do aroma. Ocorre o inverso. Como algo a ser escondido ou dissipado, o cheiro é jogado para longe de qualquer debate intelectual. Hoje, por exemplo, ao consultar o Google apareceu a banda Cheiro de Amor no topo de página.

Por mais que se tente enredar pelo cheiro, ele nunca terá o status da visão. Pode-se dizer que tal filme ou livro é realista ou reacionário. Jamais se dirá o mesmo de um determinado cheiro, se ele é marxista ou pós-moderno, hermético ou de apelo popular. Não há bilheteria para o cheiro. Ninguém vai a um local como o cinema para apreciar sensações olfativas. No futuro talvez a TV emane alguma fragrância, mas ainda assim será uma coadjuvante, enfeite de uma cena.

Sei que vão aparecer comentários indicando uma extensa bibliografia sobre esse comentário aparentemente insignificante. Pior: quem sabe não estou dando uma opinião de torcedor de Bonsucesso, com diria Nelson. Corro o risco. Só aceitarei como contraprova nomes do mundo do cheiro capazes de ombrear com Michelangelo e Proust. Até lá, mantenho a perplexidade ao perceber que o cheiro, em termos de arte, só estaria precariamente relacionado com a perfumaria, palavra que remete ao odorífico e também ao supérfluo.

O cheiro está sempre associado a outras coisas, quase nunca a si mesmo. Entre tantos outros, temos cheiro de terra molhada, o cheiro acre, tudo no ramo das comparações, e o cheiro indescritível, que explica muita coisa. É difícil escrever sobre cheiro porque os adjetivos não o explicam ou o efetivam completamente. A palavra precisaria de...cheiro. Ai pode estar o problema. Por pertencer ao mundo invisível e não produzir barulho, o cheiro torna-se um mote complicado para escritores e assemelhados. O quer dizer sobre o cheiro sem cair na seara bioquímica? Nesse caso, fórmulas e descrições de produtos provocadores de determinado odor não chegarão aos nossos narizes como informação integral e farejável. Falta o cheiro.

Enquanto escrevia os rasteiros comentários acima, Fabiano Camilo - via Memélia Moreira -, sugeriu um livro - Saberes e Odores, de Alain Corbin (Companhia das Letras). Em termos históricos, segundo a sinopse, parece interessante. Mostra que os diversos cheiros começaram a ser analisados e classificados a partir do século XVIII. “Os maus odores, antes tolerados, tornam-se insuportáveis. Passam a ser vistos como propagadores de doenças, arautos da morte e da putrefação”, afirma Dominique-Antoine Grisoni, do Le Matin. Também se refere a um "silêncio olfativo" que hoje nos cerca. Vou conferir.

sábado, 26 de novembro de 2011

Questão de escolha

Uma bela mulher se aproximou e ofereceu-lhe tudo – amor, sexo, casa, comida e roupa lavada -, mas ele fugiu, levado pela ansiedade, porque sabe como terminam essas coisas. “Se vai ter fim, melhor nem começar”. O aparato da loucura é complexo. Desejo e precaução assim tão juntos não são comuns e estragam o dia e a vida. Questão de escolha.

Ele se esconde, ela dá nova chance. Mais uma oferta. O homem pode trair preventivamente, sempre, pois se um dia vir a ser traído a vingança já estará feita. Ele não enxerga vantagem no trato. Traição lhe trará culpa, e se for traído sentirá ódio. A fase é de não experimentar sentimentos. Mesmo assim, não sabe por que seus nervos estão esticados diante da simples existência da mulher, especificamente desta, a inesperada. A corda se romperá algum dia e virá o desgosto, o remorso por não ter tentado, a depressão e os remédios. Parece não haver jeito.

A idéia do fim do amor é perturbadora e por isso a idéia do início também é. Chega um dia em que os lábios perderão o gosto, será mecânico e maçante, quase abjeto, o beijo sem sabor de beijo. E um dos lados sentirá falta disso, mesmo assim. Ademais, naquela idade crítica, é mais difícil correr riscos. A velhice se aproxima e passar o período de espera da morte com a dor da separação não está em seus planos. Evita, então, qualquer movimento brusco na área do amor. Faz o que para substituir uma dos melhores emoções da vida? Quase nada. Vive através dos romances dos outros, em romances escritos e não escritos. Deixa a decepção para o momento final, quando o balanço amoroso estará no vermelho. Questão de escolha.

A última oferta. Morro por você, disse ela. Não há acordo. Morrer, todos morrem, e acrescentá-lo a essa loucura é apenas retórica. Não a quer dessa forma, entregue e desprotegida, dependente dele. Descarta a responsabilidade de ter uma vida em suas mãos. Não morreria por ela, eis a recíproca, embora deseje o corpo e a alma da mulher. Para ele, o caso começa a perder sentido. Deixará tudo lá, em seu canto, como se nada tivesse acontecido. Antes de partir, extrai dela encantos que nem sentiu na pele. Questão de escolha.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

O agregado



Com o tempo, adquiriu certa autoridade na família, certa audiência, ao menos; não abusava, e sabia opinar obedecendo
. Machado de Assis (Dom Casmurro)



Ele adorava aquela família rica. Era quase nada diante do império levantado pelo patriarca, mas, sabe-se lá por que, ganhou intimidade no seio aristocrático, obviamente reconhecendo seu lugar. Havia compensações de sobra para ele gostar de sua semi-adoção pelos donos do mercado de máquinas pesadas: Alpes, ternos bem cortados, festas históricas e pessoas bonitas. Além de tudo, um sentimento estranho, quase de adoração, surgira desde que passou a compartir o lar milionário. Com tal sentimento, gostaria de viver pelo resto da vida.

Quando a herdeira viajava, ele entrava em depressão. Era sua referência na família. Então, voltava a seus pares sociais, até em bares de segunda, para contar as delícias do andar de cima. Nesses momentos, se embebedava e passava a pintar o retrato dos protetores.

- Os seguranças estão proibidos de olhar para a patroa, dizia. Ele expunha tais características com orgulho, absorvendo a moral dos donos, pois achava lindo tudo aquilo, e até mesmo um crime nebuloso que fechou a família em copas, ganhou ares de filme noir em sua conversa bastante atraente, salpicada com temperos de cultura livresca. Alguns de seus interlocutores engoliam o discurso; os contrariados calavam, por medo de passarem por invejosos.

O agregado em questão é um cínico. Tem família, pai, mãe e irmãos, mas pouco aparecia para vê-los. Praticamente morava em um quarto de hóspede na mansão, que usava sem pedir consentimento. No mais, abria geladeiras, folheiava livros, fazia interurbanos e pedia um motorista de vez em quando. Estava dentro das regras. O que não podia era entrar nos negócios da família. Podia – e pôde ainda mais - conhecer os mais íntimos sentimentos da herdeira. Estavam implicitamente vetadas perguntas sobre contrato e licitações. Seria intimidade demais. Ele entendia.

A herdeira de não-sei-quantos sobrenomes (aliás, sei quantos e quais, mas convém decliná-los para proteger o narrador e seu personagem) gostava de longas temporadas em hotéis, onde alugava andares inteiros para seu entourage, que incluía médico, massagista e cabeleireiro. Às vezes ele ia junto, já esteve até na Índia, e se encarregava de compras, passeios e, eventualmente, alguma droga ilícita. Não era de pedir dinheiro. O emprego público conseguido pela herdeira garantia sua sobrevivência descansada. Não precisava dar expediente. Mesmo assim esteve nadando em dívidas há alguns anos. Ficou calado, mas a madame sentiu o drama e obteve informações. Cartões, cheques especiais e despesas outras foram quitadas na hora. Ele apenas chorou ao pé da cama da benfeitora.

O marco adulatório dessa relação talvez tenha sido o encontro com a herdeira, então com 15 anos, num curso de inglês que ambos freqüentavam. Ele com bolsa integral; ela com quatro seguranças. Ficaram amigos por compartilharem banalidades, coisinhas frívolas, fofocas sobre o Jet set e alguns exotismos e esoterismos. De saída, ele sabia com quem estava tratando e cuidou de frear a admiração, que mais tarde se tornaria aberta e quase pegajosa. Depois ficou mais sóbria. Mas não seria demais, naquele momento, bajular dentro dos limites – ela adorava elogios em público, seleto público, bem-nascidos misturados com artistas. Acima de tudo se deram bem porque juntos bebiam muito, desesperadamente. Na sequência vieram outras drogas e uma hepatite C para ele.

O tempo voou, passou o século e ele manteve-se na célula-mater alheia, dominando espaços e sem infringir o código número um: você não é da família. O que mudou, então? Num certo momento, precisaram ainda mais dele para o despejo diário de lágrimas e queixas. A herdeira, a bela de outrora, transformou-se em 120 quilos de diabetes e depressão, embora ainda estivesse à frente dos negócios. Houve outras duas mortes na família, uma delas por overdose. A caçula, chegada em cultura, festas e perigos em geral.

Dia desses, pelos jornais, mais uma densa névoa desceu sobre a família mais rica daquele pedaço do Brasil. O patriarca, já morto, tinha um passado sombrio, estamparam os jornais. Esteve ligado aos nazistas, antes e durante parte da Segunda Guerra. Dessa vez ele foi convocado para ouvir a versão da herdeira e, em seguida, instruído a sair por ai, agora na condição de assessor de imprensa, administrando a crise com bastante talento e dinheiro suficiente para colocar uma pedra no assunto.

- Não vamos nos defender. Política é uma questão de gosto – instruiu a herdeira, como se estivesse tratando de uma querela PT x PSDB. A ligação com Hitler, documentada, tinha tudo para seguir em frente, nas páginas do país inteiro, mas habilidade é tudo, como ela sempre diria. O assessor e amigo não seguiu a linha de pensamento da herdeira. Preferiu adotar a clássica desculpa do inocente útil que se deixou iludir por ideologias estranhas, especialmente o integralismo brasileiro, e daí em diante passou a citar nomes transformados em vestais da democracia depois de uma temporada entre os camisas pretas de Plínio Salgado - o mais próximo que tínhamos do nacional socialismo. Usou como exemplo Dom Helder Câmara, falecido arcebispo de Olinda e Recife, cuja passagem pelo integralismo foi naturalmente ofuscada pela posterior posição de defesa dos direitos humanos.

Nosso herói, portanto, estava maduro. Como José Dias, o agregado de Dom Casmurro, chegou ao ponto em que dava palpites sobre temas da maior gravidade e antes proibidos. Abriu-se a porta para ele falar dos negócios das empresas. Começou a expor, com todo jeito, leves discordâncias táticas. Foi um pouco mais fundo, ao abordar, pisando em ovos, o comportamento deslocado de alguns membros da família diante da realidade do mercado e do País. Pela primeira vez pensou como eles eram feudais. Mas não disse isso, nem de longe, e nada em seu íntimo o faria perder a admiração e o respeito pela herdeira e sua corporação. Nem foi além da conta nas questões corporativas, especialmente a divisão de cargos. Entre ele e a herdeira, havia uma afeição parecida com a do cão e sua dona. Sem muitos questionamentos, embora ele estivesse mudando.

O importante é que, graças ao império familiar ele ganhou uma profissão. Cursou jornalismo com esse fim - defender a família na imprensa como sempre fez informalmente em outros círculos. Só que a situação era mais complicada. O patriarca, mais uma vez ele, teria uma pequena multidão de filhos e todos, num único processo, pediam a sua parte. A herdeira pressentia: primeiro vêm os advogados, depois só restam os coveiros. Junto com o nazismo, a descendência bastarda tornou-se um prato cheio para jornais e revistas semanais. O Príapo-nazi deixara uma herança problemática.

No auge das acusações e dos processos de paternidade ele serviu de ponte entre a família, a imprensa e os advogados. Avançou um pouco mais. Indicou linhas de defesa, contratou auxiliares e convenceu a herdeira a adotar gestos da responsabilidade social, defesa do meio ambiente, essas coisas. Não deu inteiramente certo. Alguns milhões foram perdidos na partilha de bens com os novos integrantes da numerosa família, alguns que nem sabiam assinar o nome. O principal, porém, foi garantido – a herdeira não perdeu o controle das ações e agora dividia com o agregado tarefas que eram dos três irmãos, todos sem jeito para os negócios, um deles metido com cinema. Por fora, ele e a madame iniciaram empreendimentos paralelos, como sócios, na área da construção civil, mineração e turismo. Uma fortuna à parte ia se formando, enquanto a saúde dela começava a dar sinais de colapso.

A morte da herdeira foi extravagante e sem elegância. Muitos gritos, fluidos e contorções. Estava desfigurada pelos medicamentos. No velório, os irmãos já estavam nos cálculos e em cima do testamento. Não sabiam que iriam encontram um ninho jurídico e burocrático que os igualava aos meio-irmãos. O agregado, ao contrário, estava rico. Bancou os tratamentos da herdeira, em hospitais do Brasil e do exterior, mas compensou os gastos com novos investimentos, inclusive num dos hospitais de excelência em que ela se internava com freqüência.

Hoje ele só lamenta não carregar o nome da família. Sente falta da herdeira, ganhou inimigos e amigos poderosos, mas a madrinha sempre está em seus pensamentos. Foi dele o discurso à beira do túmulo. Emoção bem dosada, texto limpo, a peça fora encomendada a um bom cronista da província. No final, uma frase de Shakespeare saltou da página: "A gratidão é a maior riqueza dos humildes"

domingo, 20 de novembro de 2011

No sol

No sol a pino, carregando suas sacolas com coisas sem importância, fica pensando em confortos. Um taxi e uma pizza, nessa ordem, seriam de bom tamanho, caso não tivesse caído na miséria de forma tão inesperada. Álcool, mulher e jogo não tiveram a ver com sua atual condição. A história é outra. Planejamento errado, perda de emprego, 60 anos, ausência de crédito e sumiço de parentes somaram-se todos e eis o homem no meio da rua. Não foi bem o desemprego que transtornou sua vida modesta, mas remediada. Simplesmente sua profissão deixou de existir, e com ela praticamente deixaram de existir os sete sujeitos que operavam a máquina na fábrica. A máquina, agora, opera sozinha.

Na terra

O personagem em questão é um desses plantados à terra natal, cheio de raízes, carregado de cultura nativa e popular, lotado de razões para acreditar naquilo que é nosso desde tempos imemoriais. Ele é avesso a estrangeirismos, mesmo os de seu país, pois tudo começou aqui, os mitos e os heróis, a história com suas revoluções, os ritmos, os ritos antigos e modernos. Tudo. “Fora desses coqueirais não há salvação”, ele diz, arrastando a provinciana certeza.

No Mar


Não viaje, Iraci, aqui tem o mar. Você desce e sobe a ladeira e sua casa não some da vista. A casa é grande, século 19, fachada bordada com o brasão da família. Lá fora, os meninos sempre dispostos a dar recados e levar pesos. A festa é constante, Iraci, e eu preparo sua cama e seu banho. De manhã, eu compro pães frescos e sirigüelas com hífen. Às vezes dormimos à tarde e temos um I-Pad. Pode ser assim para sempre. Não viaje, Iraci.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Enxurradas d’alma

Para minha amiga roteirista o texto é muito mais do que uma fonte de renda. É tudo. A vida diante do precipício, inferno e céu, mar calmo e mar bravio, amores e separações, juventude e morte. Um mundo real. Só que mais bem escrito e turbulento, emocionado ao extremo, sem meio termos, oito ou oitenta. Dramaticamente intenso. Escrevendo, ela chora, sua frio, ri feito um louca e, em casos mais graves, desmaia. Despeja sentimentos em forma de enxurrada, inundando sua alma sensível e seu quarto espaçoso. Já baixou ao hospital por causa de uma frase. Uma palavra pode provocar depressão ou ansiedade. Às vezes, uma letra tirar-lhe o sono. O “W”, por exemplo, espeta suas costas.

O texto diz-lhe verdades, traz boas notícias, abre um vale de lágrimas ou um campo florido povoado de noviças rebeldes. A escrita explode a cada parágrafo, estoura os limites da emoção e se ela esbarra no mau gosto, acerta o passo na sequência, transformando um pântano de breguice numa delicada paródia. Chega a achar que não existe de fato – é apenas um personagem de si mesma.

Ela não tem a afetação pública de alguns escritores, mas é enormemente afetada quando escreve. Nem os ansiolíticos resolvem seu mergulho na história. Linhas tristes, tristeza de verdade. Quando a ouve, o analista sente-se num congresso de literatura. Só ficção. Nenhum pio sobre aflições reais. Mesmo porque o analista é mais do que analista; também é personagem dela. Está em seu próximo livro, numa trama sem saída, recheada de situações desagradáveis e um suicídio quase escatológico. Os dois terminam conversando sobre o desenrolar desse romance trágico. Ele não se conforma com a idéia de morrer no final – muito menos daquele jeito.

Outra fonte de desespero são as influências. Quanto se afunda na alma do personagem lembra que alguém já fez parecido, talvez Clarice ou Conrad. Noutras horas, sente-se escrevendo à Somerset Maugham e grita: “não!”. Se andou lendo Machado logo aparecem ironiazinhas bem clássicas e ela desce as escadas do prédio, correndo, para uma volta no bairro, sem destino.

Minha amiga quer uma literatura selvagem, sem interferências externas, ligada ao sistema nervoso central, com a exasperação no talo. Nem sempre consegue. Nessas horas, a família entra em cena e a recolhe para uma semana na Clínica.

Publicado no malvadezas em 09/11

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

De carona na Fliporto

A marquesa de Varadouro Y Milagres, Daniella Miranda, convida para o lançamento do livro “Todo dia me atiro do Térreo”, de Lula Falcão, em seu solar da Rua Joaquim Nabuco, nº 5. O evento será nesta sexta-feira (11), às 21h, após a abertura da Fliporto. A histórica casa da marquesa de Monte Alegre está sendo restaurada e em breve será transformada em centro cultural.

“Todo dia me atiro do Térreo” (editora Bookess) - já lançado em São Paulo, Rio, Recife e Fortaleza – conta a história da fictícia Maria Lúcia, viciada em twitter, sexo virtual, vodka e literatura. Agora, o livrinho pega uma carona na Fliporto.