segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O inferno são as outras

@ A pior coisa pode acontecer é dizerem que sou “uma figura folclórica”. É como chamar uma cidade de “lugar pitoresco”. Uma bêbada aceita. Uma Rebordosa. Não. Não faço nada além do que penso. Às vezes penso e nem faço. Qual a diferença entre fazer ou só pensar? Respostas, obviamente, ficam para depois. Quando? Não sei. Talvez isso ajude a me explicar um pouco. Ou pode embaralhar tudo de vez. Não sei, você não sabe e, acima de tudo, não ele não se importa. Deixa prá lá, como convêm nessas horas.

@ O fato é que sempre quis ser outra pessoa, mas, ao mesmo tempo, continuando a ser eu mesma. Entende? Acho que, pelo grau de inveja, eu queria ser uma tipo paulista bem-intencionada em praia semideserta do Nordeste. A que anda com argentino rastafári e com o negão mais popular do pedaço. Faz bazar, tem pulseirinha no mocotó e adora a lua cheia; as que quase sempre têm no fundo a mesma história: problemas com o namorado, na metrópole, e por isso a adesão repentina a um mundo pelo menos distante da realidade. Trepadinhas com nativos (uma para cada um, se não complica) e delicadas dissimulações, na sequência.

@ Eu poderia ser também uma CDF linda enturmada. Com bolsa na universidade, capaz de discutir com os rapazes de igual para igual, enquanto mantém o ar de inatingível. Convive bem em alguns bares, mas sonha mesmo é com um jogador de pólo aquático do fluminense e com o professor de Estética, bem mais velho. Garota dos extremos, destrói o casamento do professor antes de se atirar pra valer na piscina do tricolor carioca.

@ Mas não, eu sou eu. Moradora de quitinete, bem humorada da boca pra fora, em busca do tempo perdido e nunca achado, ligeiramente alcoólatra, maconheira com limites, ex-atriz, ex-produtora, ex-fazedora de projetos pra lei de Incentivos à cultura e agora ex-escritora e ex-roteirista sem nunca ter saído da primeira página. Quando falam em fracasso, eu levanto a mão. É comigo.

@ Mas deixa pra lá (como sempre). Pelo menos ganho uns tocados tuitando para rede de faculdades que sobrevive sob a implicância do Ministério da Educação. A quitinete, continua mal. Mas casa desarrumada tem suas vantagens. Você acha tudo mais rápido. Isso porque quando desaparece alguma coisa numa casa super organizada é para sempre. Não estava onde devia estar, fudeu, sumiu de vez ou alguém roubou. Na casa bagunçada, não. A coisa pode estar em qualquer lugar. Um dia você acha.

@ Moral da história: nenhuma.

@_lulafalcao

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A Casa caiu

@ Deitada em minha cama, olhando para o teto. Aos poucos, começo a ver algo se movendo. Era o próprio teto, daqueles de gesso, dando sinais perigosos. Vai colapsar, pensei, usando o verbo que a imprensa brasileira aprendeu em 11 de setembro de 2001. Pulei da cama a tempo de não ser atingida pela placona branca. Desabou tudo e, pior, destruiu o laptop, meu único bem material. A casa caiu e estou off-line.

@ Sem TV, rádio, teto e dinheiro para reverter o desastre, tomei a decisão que me pareceu mais adequada ao momento: fui ao bar da esquina, tomei cinco doses de vodka, e dali parti para uma das piores viagens da minha vida. Não sei de muitos detalhes, mas o que passa pela minha cabeça agora, nessa enfermaria de hospital público, é a mãe de todos os pesadelos.

@ Parei ai. Como desenvolver a porra desse roteiro se não tenho a menor idéia do que vai acontecer na sequência do porre e do hospital e especialmente porque diabos fui parar ali depois das vodkas. Por isso que gosto dos iranianos – os cineastas, bem entendido. Botam uma menininha para andar por um povoado qualquer, salpicam algumas falas bem cotidianas e pronto, está feito o filme. Quero uma história mais roliúde, mas ela só tem começo.

@ Vou até a cozinha. Vejo uma barata. Acompanho seus movimentos. O que a barata está pensando? Como será sua vida em família? O que se passa naquele universo? Baratas... Não, é meio Discovery Channel ou vão ligar a coisa ao Kafka. O roteiro, então, fica para amanhã. Mas devo reconhecer: esse fumo é muito bom.

@ Volto para o quarto – inteiro, ainda bem – e entro no twitter. A experiência de tuitar meio doidona me parece sempre interessante. Há várias pessoas que fazem isso, senão milhares. Por isso o twitter fica dividido entre o pessoal que discute política e o povo que pergunta, por exemplo, qual é a velocidade do escuro. Sou da segunda turma. Não tenho o menor saco de defender a candidatura de A ou B, mesmo porque a eleição passa e eu permaneço aqui, parada, do jeito que era no governo anterior e do jeito que serei no próximo. Não que a política não mude as coisas, muda. Eu é que não saio do canto.

@ Continuo tuitando meio lesa. Longe de mim fazer apologia das drogas – mesmo porque, apesar de usar algumas, sou contra (menos contra a cannabbis, obviamente). O álcool, no meu caso, é a droga mais pesada. Às vezes, no entanto, é a única saída. Principalmente para quem está beirando os 40 e ainda não descobriu qualquer sentido para a vida. A não ser que existe sexo, vodka e Internet. Se Deus existir, entra na lista: sexo, vodka, Internet e Deus. Nessa ordem.

@_lulafalcao

domingo, 22 de agosto de 2010

Uma intelectual por osmose

@ Nunca acreditei nas amigas que diziam que gostavam de ficar em casa lendo e ouvindo um som. Mentira. Naquela idade, eu não parava quieta. Gostava de sair. Por isso, quase toda minha cultura vem por meio de terceiros, nos bares, de gente que lia mesmo, e passava tudo de segunda mão pras meninas. Umas embarcavam, interessadas; outras caiam fora e se transformavam no que hoje chamamos de patricinhas. Para não ser patricinha é preciso ter um instinto elaborado – uma coisa anterior à inteligência. Eu tenho; as patras não têm.

@ Não li quase nada até a chegada pra valer da Internet. Sou da transição Altavista-Google. Mas posso conversar horas sobre a obra de Proust sem nunca ter aberto um livro dele. Ouvi tudo, atenta, por ai, no Brasil. Nessa marcha, fui evoluindo, passei a fazer uma estante imaginária de amigos-amigas-namorados-namoradas. Cada um era um livro vivo. De certa forma, então, eu lia neles. O tempo correu, passei a ler de verdade e hoje até compro a revista Piauí.

@ O chato é encontrar esse pessoal que faz mestrado e doutorado. Acadêmicos. Querem tudo certinho, com datas e outros pormenores, e assim a conversa fica quebrada, cheia de interrupções, só porque às vezes confundo datas, nomes e autores. Só faltam dizer: livro tal, tantas páginas, edição de mil novecentos e tanto, capa dura. Vão se fuder, né?

@ De resto, era respeitada pela turma do bar pela simples razão de ser meio intelectual, meio de esquerda, como diz o Antônio Prata. Mas acima de tudo por entender e rir de piadas, digamos sofisticadas, como aquela do Kant, I can’t e a universidade de Havard. Não vou contar aqui porque esqueci.

@ Outra coisa inevitável para gente do meu tipo é ser acompanhada por um séquito de gays durante um certo período da vida. São conselheiros sentimentais, produtores de seu dia a dia, amigos leais, mas somem ao menor sinal de bofe. Depois ressurgem, chorosos, vindos de algum insucesso amoroso. Nessas horas, dou uma assessoriazinha básica.

@ Entro nessas reminiscências enquanto encaixoto minhas coisas. O casamento acabou, o filme não saiu, mas não fiquei inteiramente no prejuízo. Uma pensãozinha alimentícia vai dar para pagar o aluguel da quitinete – mais uma -, a banda larga e o miojo de cada dia. Agora disponho de tempo integral para o twitter e para escrever sobre minha vida. Espero que meus fracassos façam algum sucesso. O leitor médio adora a desgraça alheia.

@ Em todo caso, menos mal. Estarei envolvida com minhas partes sem a interferência pouco especializada de maridos e afins. Problemas, sofrimentos? Passo uma camada de Rivotril por cima. Lidarei comigo com condescendência, sem exigir nada em troca. Exceto, claro, alguns orgasmos auto-induzidos. É o que se leva deste mundo.

@_lulafalcao

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

O casamento e o processo criativo

@ Dramas morais, corrosão do caráter, traições, desastres, reviravoltas políticas, mutações genéticas, fim dos tempos. Pensei nessas coisas para o meu filme de estreia, mas depois de alguma reflexão resolvi resumir tudo num único tema: sexo. Queria algo entre Jacques Rivette e Buttman. Algum romantismo como pano de fundo para uma sequência de orgasmos. Com trilha sonora de Philip Glass e Amado Batista. Na verdade, não sei direito o que quero. Sempre penso no efeito antes da causa. Então sonho recebendo um Kikito (não sonho tão alto, né?) antes de escrever o roteiro.

@ Tudo isso para não depender a vida toda do marido, diretor bem-sucedido, excelente pessoa, mas péssimo na cama. Casada há poucos meses, descobri que amor e sexo não combinam muito – e que casamento e sexo combinam menos ainda. São quase incompatíveis. Além disso, a maioria dos homens não sabe o que fazer com uma mulher na hora agá. Tem uns que até começam bem. O problema é que deixam a obra inacabada. Meu caso é mais grave. A obra não existe. Nem sexo nem amor.

@ Então já estou planejando a retirada. Aproveito a influência do marido para entrar no mundo do vídeo e do cinema e, na sequência, cair fora e me virar por conta própria. Muita gente faz assim nesse meio. Reconheço que é uma sacanagem aterradora. Por sorte, me perdôo com facilidade. Tenho mais pena de mim do que dele.

@ Ocorre que as idéias não se encaixam, sou dispersa demais para começo meio e fim. A última tentativa de colocar um filme no papel resultou numa mistureba sem pé nem cabeça em que só se salvavam as trepadas. Se for assim, melhor entrar na indústria pornô. Pena que lá não precisam de roteiristas.

@ Outra coisa que atrapalha é o material que eu trouxe do sex shop onde trabalhava. Faltou assunto, recorro ao meu Vibrating Divine Dolphin. O twitter também é um embasso. Estraçalho meu projeto de roteiro em pedacinhos de 140 caracteres pra ninguém retuitar.

@ Mas chego lá. O negócio é inverter totalmente as prioridades. Vou terminar o roteiro e o casamento. Não preciso de amor e carinho. Meu negócio sempre foi sexo e isso eu resolvo sozinha. Preciso de patrocinadores. Neste momento, a Petrobras e o BNDES são mais importantes.


@_lulafalcao

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

A tuiteira vira produtora de vídeo

@ Nunca tive a pretensão de escrever nada esteticamente precioso ou relevante enquanto tuitei para o sex shop do centro. Agora, como produtora de vídeo, sigo na média, num curso natural, que tem mais a ver com o meio em que passei a viver do que com talento ou qualidade do meu trabalho. Pra encurtar: adotei a mesma profissão da maioria das minhas conhecidas. Tem horas que penso que o único jeito de uma mulher com meus predicados ganhar a vida é como tuiteira ou produtora de vídeo. Faça as contas: chegue num bar desses ai e peça para quem for produtora de vídeo levantar a mão. O resultado vai surpreender.

@ As produtoras de vídeo têm incríveis capacidades. A primeira delas é a de esconder quanto ganham. Tanto as que ganham muito quanto as que ganham pouco ou quase nada. As moças do primeiro time são enigmáticas na arte da esconder a pequena fortuna. Não pagam nada pra ninguém e vivem em bocas livres. Mas só pra disfarçar. Já as do segundo time se fazem de pobres, para pensarem que elas estão fazendo gênero, quando na verdade elas são pobres mesmo. Meu caso.

@ Uma produtora pode ser simplesmente uma fazedora de projetos para lei de incentivos, como eu era antigamente. Apenas esteve no lugar certo e na hora certa para ganhar a nova patente. Pode ser viagem minha, mas não tenho encontrado muita gente que não seja produtora de vídeo ou de cinema, assessora de imprensa, gestora de mídias sociais ou animadora de festas infantis. Todas como eu enchem a cara com freqüência (diária) e conhecem as mesmas pessoas (homens na maioria dos casos) que podem dar uma mão em troca de algumas frases espirituosas ou de sexo. Nada assim, como comentam que acontece nas redes de TV (é boato, viu). É algo mais namoro-amizade em que as partes, às vezes, até sofrem de verdade.

@ As coisas melhoraram pro meu lado sem que eu tivesse que mexer uma vírgula no meu comportamento insano. Mesmo depois de ter conhecido um diretor bem-sucedido, autor de muitos comerciais que você já deve visto na TV. Certo, é varejão, mas dos bons. Aos poucos eu vou chegando lá, na casa dele. Umas pecinhas vão ficando no guarda-roupa e, logo, logo, finco minha bandeira no território do moço: calcinhas penduradas no banheiro.

@ A invasão se dá de forma sutil. Um dia ele me pergunta por que eu não durmo lá. Devolvo: “Vou vestir o que amanhã?” Não fico e, atendendo a pedidos, apareço no dia seguinte com uma pequena mudança. O laptop vai junto. Devagar, o estoque íntimo desembarca também. Até o material que ganhei do sex shop, à quisa de indenização, entra no balaio. Pensei em botar a loja na Justiça, mas o dono, meu ex-amigo, fez um acordo: no lugar do FGTS, me deu um hand finger, dois “I Rub my Duckie” e um micro vibrador Byzz Pleaser com 7 velocidades e à prova d’água. Equipamento útil. Meu diretor sempre chega cansado em casa.

@ Enfim, me estabeleci. Até quando, não sei.


@_lulafalcao

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

A tuiteira arruma um emprego. Num sex shop

@ Estava no muquifo suburbano, sem eira nem beira, matando cachorro a grito, comendo o miojo que o diabo amassou, quando o celular deu sinal de vida. Boa notícia: trampo. Um amigo perdido no espaço e no tempo virou empresário e me chamou para o único trabalho que, de fato, sei fazer: tuitar. Em nome de um sex shop, no centro. Minha função será divulgar os produtos com certo molho erótico-filosófico. A grana não é lá essas coisas, mas o importante é fazer o que se gosta, não é mesmo? Só tenho que não misturar diversão e trabalho, pois pesquisei o portfólio do estabelecimento e descobri uma série de utensílios que merecem um test-drive. Conheço razoavelmente o ramo de vibradores e afins. Então não fui chamada só porque sou amiga do cara. Tenho currículo.

@ No primeiro dia de trabalho, travei. O que escrever sobre uma vagina artificial, sem mulher em volta, e ainda por cima feita com material de segunda linha? Quem em sã consciência faria sexo com aquilo sem perder o respeito próprio ou o senso de ridículo? Depois pensei com calma, revirei meu passado, lembrei que já tinha feito coisa pior, e passei a ver o negócio com outros olhos. O mercado, meus lindos, não é chegado a dramas morais.

@ Preciso de uma estratégia vendedora, como se diz no mundo corporativo. Então, nessa perspectiva, tenho que agregar valor à xota de borracha dando-lhe significados mais nobres e salientando suas vantagens em relação ao similar humano. Quais? Ora, as de verdade costumam ter donas que reinam sobre seu funcionamento, nem sempre preciso. Aqui, não. O entra-e-sai ocorre sem preocupações com o dia seguinte. Prazer garantido ou o seu dinheiro de volta.

@ Para pensar assim, preciso abstrair um bocado de coisas, mas nesse momento o mais importante é vestir a camisa da empresa, pagar o aluguel atrasado e cair fora do muquifo. Como disse o Jarbas Passarinho (cito cada um), "às favas todos os escrúpulos de consciência”.


@_lulafalcao

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Tuiteira: uma esnobe no subúrbio

@ Sai da casa dos pais direto para classe C. Um cômodo num cortiço enquanto arrumo um emprego ou coisa parecida. Está bem equipado, a vizinhança é boa, mas eu não teria coragem de chamar uma pessoa conhecida para ver isto aqui. A quem pergunta onde moro, respondo: um loft na Vila Madalena. Sem mais detalhes.

@ Vim conhecer nosso padrão de ascendência social de perto. Leio que os pobres estão consumindo mais, formam uma nova classe média etc e tal e cá estou eu, como um deles, desfrutando as delícias do espetáculo do crescimento. Não tanto assim, mas dá para enganar o estômago, ainda tenho o computador (minha mãe paga a plaquinha) e daqui a pouco vou à mercearia comprar uma vodka ou duas. O novo esconderijo merece algo especial, hoje à noite: miojo sabor galinha caipira + Dolly limão.

@ Meu medo era ter que frequentar lan houses, o resto passa. Também não preciso tomar contato com o pessoal do lado, cuja conversa sobre as mazelas do trabalho me deixam deprimida. Vivo trancada ou sumo por uns dias. Aparentemente, não notam minha presença. Nem mesmo quando faço alguns barulhos, à noite, diante da tela, ouvindo histórias que sensualizam minha existência por algumas horas.

@ Mas a excursão sociológica só é boa no início. Quero voltar pra casa. O problema é que minha casa agora é aqui. Na semana passada, sai do conforto do lar paterno, onde cumpri um período de convalescença financeira. Era bom (quer dizer: mais ou menos). Depois ficou esquisito. Comecei a sentir certo incômodo no ar. Por mim estava tudo bem ou parecia que sim. O incômodo era deles, dos meus pais. A cada dia fica mais claro que não contavam com minha presença neste mundo. Principalmente agora: desempregada, sem dinheiro e prestas a completar 36 anos. Só então percebi que minha família não é tudo. Aliás, é quase nada.

@ Um dia o velho tomou coragem e me emprestou R$ 1.8 mil a fundo perdido. Era a senha para eu cair fora. Portanto, não tenho para onde voltar, exceto de vez quando para o apartamento de um cara que conheci no twitter e que me requisita na baixa temporada. Lá, pelo menos, tem TV a cabo. Fica na classe B.

@ Já estou no loft-muquifo há alguns dias. No subúrbio, com todos os seus estereótipos. Musica nas alturas, programa Raul Gil, baixarias no bar da esquina, caça-níqueis clandestinos, DVDs piratas e o evangelho segundo Edir Macedo. Vejo tudo de longe. Não tenho estômago para discutir a atuação do Corinthians pensando ao mesmo tempo nos meus amigos do twitter que estão na Flip. Aqui ninguém sabe quem é Terry Eagleton ou Robert Crumb. Rola muito Gian & Giovanni, Bruno & Marrone e Edson & Hudson, quando não rola o pior: axé. Outra coisa: o Orkut, nessas bandas, é o que há. Em suma: a classe C ainda não chegou ao paraíso. Faltam saneamento básico e bancas que vendam Piauí e The Economist. Ser pobre e chique ao mesmo tempo é um desafio de logística.

@ O jeito, então, é me isolar. Como a TV aberta só me oferece o pior dos mundos, especialmente aos domingos, fuço meu laptop à procura de terras distantes. Coisinhas de Londres, bandas desconhecidas, sites pornô e o twitter. Minha nóia é achar que descobriram meu estágio de penúria e o twitter, como se sabe, não gosta muito da crônica suburbana. Prova disso foi a enxurrada de unflows que levei nesses dias.

@ Nessas bandas, o kit de sobrevivência inclui mochila, bilhete único, miojo (também conhecido como lámen instantâneo, criado na II Guerra pelo senhor Momofuku Ando), celular pré-pago, unzinho, Neosaldina e vodka a gosto. Muita.

@ Enfim, como disse não sei quem, as coisas estavam piores...mas foram piorando.

@-lulafalcao

domingo, 8 de agosto de 2010

Memórias da tuiteira: “Todo dia me atiro do térreo”

@ “Todo dia me atiro do térreo”© é o nome do meu livro de memórias. Pelo menos das partes que me lembro. Minha infância, por exemplo, estava num pen drive. Perdi. A adolescência foi passada entre quatro paredes, inventei uma. A vida adulta está meio prejudicada pela vodka, mas as passagens mais trágicas estarão mescladas com informações do Google. Roubei umas vidinhas parecidas com a minha.

@ Depois que sai do quarto, à base de Zoloft, virei garota das baladas de lojas de convivência. Ambientes de grande efervescência cultural dos anos 90, apesar do jeitão maurício de seus freqüentadores... mas, a propósito, eu estava falando mesmo sobre o que? Ah. O livro de memórias. Estou bêbada.

@ Pois bem. Depois dos 17 anos, quando não estava na loja, bebendo do lado de fora, ia pro Mandaqui tomar Dreher e jogar nas maquininhas. Programa de macho.

@ No fim, claro, terminei optando por intelectuaizinhos de merda, galera com a qual convivo até hoje, por força do hábito. Mesmo porque o tal ambiente cultural das lojas de conveniência deu em nada. Daí a migração para um bar onde conheci gente mais velha e interessante. Principalmente interessada em mim, em particular em minhas perninhas firmes e fortes. Naquele ambiente saudável, onde dar não traria comentários maldosos, me esbaldei. Logo, logo, seria atriz.

@ A carreira no teatro durou pouco. O talento, no meu caso, foi sumindo à medida que os anos e os quilos iam pesando. Daí para os bastidores da cultura foi um pulo. Restaram-me os projetos de incentivo à cultura, onde desenvolvia ideias inúteis, como a que propunha levar um grupo de Hip-Hop para uma aldeia de índios. Uma estatal entrou com algum, mas o negócio não foi em frente. Nem o Hip-Hop nem os índios nem eu.

@ Como o trabalho andava mal e deixei de ser mascote dos cinqüentões, sobraram apenas o álcool e outros aditivos. Sem futuro e com um passado bastante avariado, resolvi sair da cidade. “Vou tirar um ano sabático”, avisei - e parti para um tempinho Nos EUA. Igual a todo mundo que viaja sem bolsa e pouco dinheiro, usei a desculpa básica: preciso aprimorar meu inglês. Voltei 15 meses depois, com o mesmo inglês de sempre – quase nenhum – e um alentado currículo como babá, lavadora de pratos e housekeeper. Quase morri de fome.

@ De Boston direto para um quarto e sala no centro e, pior, aos projetos de Minc. Pelo menos deu para comprar um computador de segunda mão e um estoque de Smirnoff. Passei a viver virtualmente, mesmo quando não deu para segurar o ap e me aninhei na casa dos pais, falida. O resto vocês saberão quando saírem minhas memórias, nesta altura quase póstumas.

@_lulafalcao

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Faço e aconteço enquanto posso

@ Distraída, deixei o foda-se ligado e assim foi ficando. Faz tempo que não paro pra pensar no significado de chutar o balde e mandar tudo à puta que o pariu. Mas não é tão grave é assim, vá lá, tenho método. A idéia é morrer aos poucos, o que não chega a ser uma novidade, pois acontece com todo mundo. Todos morrem aos poucos. O meu caso é diferente porque sei disso e, sabendo, faço e aconteço enquanto posso (meio rimado isso, mas vou deixar).

@ Com o tempo e milhões de doses de vodka, descubro que o sentimento de culpa foi embora. Não sou exceção. Ando por ai e encontro algumas mulheres da minha idade que estão deixando de lado o futuro em troca das merrecas emocionais de hoje à noite. Pouca gente faz alarde desse, digamos, estilo de vida. Eu faço. Mas chega de reflexão. Cansa.

@ O certo é que dinheiro acabou. Num mundo em que as sensações têm preço, é uma desgraça. Amigos pra pedir grana emprestada, nenhum. Banco, Serasa. Emprego, fui. Status no agiota: pendurada. Solução: meus pais. Voltei pra casa paterna aos trinta e tantos anos e o pior de tudo é que não me sinto fracassada. Trato com umas férias. Quarto e computador de graça contam mais pontos que decepção familiar. Eles, pai e mãe, até procuram disfarçar o clima de fracasso. Menos mal.

@ O principal é que não incomodo. Quase não saio do quarto e quando saio é direto pra rua. Às vezes minha mãe aparece. Conversa por alto e, no máximo, dá informações sobre um concurso pra auditor fiscal em Rondônia. Não me animo. Com banda larga, tanto faz Rondônia ou Leblon. O problema é virar funcionária pública, que é uma espécie de morte em vida. Além disso, gostei deste quarto.

@ Feliz no novo lar? Não. Também não era no outro. Pelo menos aqui não pago. A linha é boa, não cai. Sigo escrevendo verdades e mentiras. Como diz meu amigo Jaron Lantier, sou caricata na rede. Escolhi apenas uma parte de mim para expor publicamente. As outras são bem piores.

_@lulafalcao

terça-feira, 3 de agosto de 2010

A tuiteira existencialista

@ Leio no Globo que viciados em Internet têm mais de risco de depressão. Não é o meu caso. Já entrei na Internet deprimida. Venho aqui para expor mazelas e sequelas pré-existentes. Meu mundo caiu – e quebrou – no século passado.

@ Só os crentes não têm depressão ou disfarçam o mal estar com Jesus e outras compensações do além. Como não acredito em vida depois da morte (atualmente, nem antes), só me resta pensar o tempo todo na falta de sentido das coisas: daqui a pouco completo 40 anos, depois 50, depois 60... acabou. Em determinadas idades até um orgasmo pode vir junto com um AVC.

@ O jeito é tirar o máximo de proveito do corpo enquanto ele aguenta. Mesmo aqui, trancada no apartamento, dá para arrancar alguns prazeres baratos. Nem que seja tuitando com desconhecidos como se o mundo fosse acabar amanhã. Escrevo e falo o que me vem à cabeça. Quase sempre o assunto é sexo. Às vezes um pouco de cultura e política, mas só para chegar ao que interessa.

@ No mais, álcool e cigarro. Sou favorável à lei antifumo, mas não vejo muita vantagem em ser enterrada na ala dos não-fumantes. Alguns dizem “você está se matando”. Respondo: você também. Anos e anos de academia ou anos e anos de Marlboro cedo ou tarde darão no mesmo lugar.

@ Claro que uma existência sem sentido levanta um monte de perguntas na minha cabeça: o que vou deixar para a posteridade? Sairei da vida para entrar na história? O mundo vai acabar em 2012? Dilma ou Serra? Nessas horas, o segredo é não buscar respostas. Fujo numa boa. Sento diante do computador, encho o copo de vodka, cato o primeiro escroto e o dia segue o seu curso.

@_lulafalcao