O dorso é a parte mais interessante, enquanto ela se debruça sobre a última prateleira da estante. Quer apresentar um volume raro, adquirido num sebo de Paris. Finjo curiosidade para apreciar melhor a parte descoberta entre o final da blusa e o começo da saia, região rija e bronzeada e acontecimento que está me valendo o dia e a noite. E ela ainda se ergue, no fim do espetáculo, para entregar-me o clássico. Não sei decifrar o título em francês, embora apalpe as páginas, sentindo a textura. Tudo mentira. Digo “interessante, com reticências, pensando de fato naquele momento de despretensiosa exibição. Não deu tempo sequer de analisar a bunda. O dorso bem plantado no corpão pós-40 já bastava, por ora.
Somos apenas bons amigos, como ela enfatiza sempre, embora considere essa observação um sinal de derrota para minhas tímidas investidas. Pior quando começa a contar, sem pudores, encontros com homens mais novos, gatos, como ela os chama. É difícil. Eu escrevo “querida”; ela responde “querido amigo”. Elogio seus lábios; ela destaca minha aguda percepção sobre temas gerais. Escolheu minha amizade e eu penso em seu dorso. Isso não combina.
Às vezes, dependendo da ocasião e do olhar, as partes do corpo chegam à mente com nomes mais rudes, dorso vira lombo, como a face póstero-superior da perna é o mocotó. Seja como for, a área em questão é abrangente, antiga e moderna, La Venus del espejo turbinada, saindo da academia, ligeiramente suada. Chego mais perto, apalpo de leve, com breve comentário sobre as qualidades estéticas da pose anterior. Ela ri e cai fora, não oferece muita resistência nem mostra entusiasmo. É sempre assim.
sexta-feira, 6 de janeiro de 2012
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