terça-feira, 6 de outubro de 2015

Miniminimalista


Tudo pronto para quase nada. Espetáculo Infinitesimal em dois atos. No primeiro, escuro completo; no segundo, silêncio total. Não há cadeiras na plateia e o público não é visto a olho nu. Só existe teoricamente nesta nova montagem de Hamlet. A questão, no entanto, está posta: ser ou não ser? Os críticos se dividem. Um deles, neologista, chamou a peça de miniminimalista, assim, sem hífen. Outros consultaram físicos de partículas. Em todo caso, houve uma profusão de elogios à linguagem enxuta e concisa, pois tudo foi comprimido à pergunta essencial, sequer pronunciada, mas sugerida de forma sutilíssima por um ator que sequer estava em cena.

A vaga e célebre montagem veio para mudar nossa acomodada noção de diversão e arte. Agora, dizem, não é mais nada daquilo que conhecíamos como teatro, embora a fórmula já tenha sido tentada, no século passado, numa peça sobre o Gênesis, onde também não havia atores. O big-bang bíblico teve alguns inconvenientes. Quando Deus disse “haja luz”, não houve, por questões técnicas com a iluminação. Mesmo assim, o Todo Poderoso seguiu adiante, clamando pela expansão no meio das águas e aí, de fato, peixinhos de papel crepom circularam ao redor da arena, amarrados em fios de nylon, bem perto da arquibancada, quase diante dos nossos olhos. Arrancou surpresas e aplausos. Mas foi só.

O que vemos no recente Hamlet é a efusiva presença da ausência, o conceito no lugar de coisas e pessoas, o fim definitivo da penosa produção teatral - carpintaria, artilharia e outras dificuldades logísticas. Uma entrevista coletiva, muito bem dada, substitui tudo. Um ensaio ali, outro acolá, contornam o que o que Kant chamaria de  "pseudoproblema" e os astrofísicos de “singularidade”. Trata-se, enfim, do instante zero da dramaturgia nacional.  "O resto é silêncio".

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