Madrugada terrível. Só vi uma assim em Angústia, de Graciliano. Parecia que não ia acabar e eu não sabia o que seria melhor, acabar ou não. Caso a madrugada se congelasse ali, estaria de bom tamanho. De qualquer forma, a imagem do dia chegando gelava os nervos. Até o final da tarde, meu ego estava exposto à visitação pública, eu tomava minha cervejinha, ainda seguro, usufruindo a sobrevida. Agora, sou um homem aterrorizado. Um mês de férias. Um mês fora do inferno e amanhã, quer dizer, hoje, tudo recomeça.
Não gosto de trabalhar, pelo menos não
gosto do meu trabalho. Detesto a empresa, meus colegas são insuportáveis e o
salário é uma merda. Tenho cisma especial com o tipo que veste a camisa da
empresa e adota seus conceitos de produtividade e resultados. Um dia é
demitido, tenta voltar a falar como antes, mas não consegue. Vira um zumbi
corporativo, pois, desempregado, perde o pé das mudanças no jargão empresarial
e sai por ai, dizendo que isso e aquilo agregam valor.
Quem conheceu sujeitos assim, como conheço,
sabe do que estou falando. Mas a questão central aqui é a volta para o trabalho
e o fim de uma série de prazeres reais, como ler até tarde, acordar tarde,
almoçar a qualquer hora, andar sem destino. Um bom argumento para a volta - e
explica em parte porque não me demito – é a necessidade do dinheiro.
Todos dirão isso, embora eu tenha em mente
um sistema de trabalho mais flexível e não obrigatório, como, aliás, também
poderia ser o voto. O governo e os empresários um dia terão que fazer isso
porque o mundo do trabalho está a cada dia enxuto. O que fazer com o restante?
Não se pode deixar a mão-de-obra excedente na miséria? Então, o trabalho
torna-se um ambiente para pessoas realmente com vocação, entusiastas,
empreendedores, as que se dizem felizes e realizadas como o que fazem. Não é o
meu caso. Eu me sentiria feliz sem ir trabalhar todos os dias – melhor ainda,
dia nenhum - e gostaria de receber por isso.
Não se trata de seguro-desemprego ou Bolsa
Família. Pode ser um salário menor do que os trabalhadores formais, embora
digno o suficiente para garantir aluguel, alimentação, lazer, transporte,
cultura e plano de saúde. Uma espécie de vida sabática. As empresas
continuariam seu modo capitalista e nós, não trabalhadores, teríamos enfim as
delícias de um socialismo moreno, ou melhor, bronzeado.
Minha tese é obviamente mais complexa,
envolve economia para as empresas em encargos trabalhistas e alguma
contribuição dos desempregados em termos de conceitos existências. O problema é
que agora estou com uma preguiça danada, amanhã volto ao trabalho e o dia já
está amanhecendo.
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