segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Ansiedade





Então, o momento atual remete ao momento seguinte, antes de ser absorvido por inteiro agora, valendo esta ansiosa agonia para fatos mais relevantes - amor, vida e morte. Apaixonado, previne-se contra a separação iminente, no emprego faz planos para a demissão a qualquer hora e mesmo fisicamente sadio vive sobressaltado pelo fim. Espera por copas do mundo, carnavais e verões e sente-se contrariado por não achar nada demais quando o grande dia chega. Só tem pensamentos para situações seguintes, e eis o futuro atrapalhando o presente e o passado.

Está carregando o que virá em sua história, enquanto tenta explicar como funciona o que sente, quase sem prazer, embora a atividade da escrita seja a única em      que se detém e presta atenção, livre da ansiedade.  É um caso clínico e existencial e também um caso literário. Seus textos começam por impulso, sem nada na cabeça, e ele espera que surja do nada na cabeça um pedaço de ideia, sobre si ou outros, e o passo seguinte é dispor esse pensamento em comparação com alguma coisa real, as condições do tempo ou uma mulher, por exemplo, e em seguida envolve tudo numa situação, num cenário, e dá voz aos personagens, descreve o ambiente, mas não perde tempo com muito paisagismo, pois chateia o leitor.

Normalmente os personagens caminham em direção a um final já planejado, correm sobre um roteiro, seguem um destino. Não é o caso dele. O texto só terá o momento presente. Amanhã pode ser diferente – outro rumo, outra prosa - e ele e seus fantasmas não têm um mapa. Só a estremeção inicial, transformada aos poucos em conceito, num jeito de encaixar as palavras ou numa confusão sem pé nem cabeça. Ele acumulou influência a ermo, sem método, deu nisso, mas segue adiante.

Ocorre então um problema, há personagens vagando na periferia da história, sem motivo, sem o atalho para entrar no enredo e ele tem certeza que eles devem entrar, não sabe por onde e quando, se no próximo parágrafo, daqui a dez páginas, sentirá um prenúncio. Evita provocar um encontro casual, no meio da rua, entre o pivô do enredo e o coadjuvante, vivente noutro enredo, de segunda classe. Arruma uma junção verossímil ou fantástica, contanto que seja metricamente interessante, com ritmo e ironia, se for o caso. Divaga. Era bom que assim fosse assim na vida real.


Se não consegue, tenta de novo, espera um impulso, apela aos seres rastejantes de Dostoievski e de todos os doentes da literatura. Há um imenso vazio a ser preenchido e ele vai com calma, toda calma que falta ao curso de seu dia.

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