quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Galera: vida e morte

@ Andaram estranhando porque tenho mudando muito de idéia e de assunto de uma história pra outra. Querem o que? Um continuísta? Não dá, meu. As coisas estão seguindo seu rumo na medida do possível, embora eu não garanta clímax. Nem sei fazer isso. Posso terminar como mãe de propaganda de Margarina (apud @AnaAragao) ou como interna numa clínica em Sorocaba. Posso até nem terminar. Ou dizer: acabou aqui. Fim de papo.

@ Posso tudo, então. Posso, por exemplo, tentar pôr ordem no enredo e, ajeitar, a meu modo, um final satisfatório para ambas as partes – eu e você. O primeiro passo é um esqueletinho básico, que começa comigo e termina comigo também. Vamos lá: moça de bairro intermediário – subúrbio, mas de classe média – resolve sair com uns caras diferentes, começa a receber informações diferentes e acaba uma pessoa bem diferente das outras. Para o bem e para o mal.

@ Você passa não achar a menor graça na vizinhança e empenha a vida em viagens de ônibus até o centro ou outras bandas. Os amigos de verdade moram longe. Pode se considerar um episódio que só acontece em cada trilhão o encontro dessa galera. Afinal, tem pouca grana para se locomover, mas resolve mesmo assim viver em outra dimensão da cidade, onde estão os seus, e gostar exatamente das mesmíssimas coisas. Todas, obviamente, esquisitas. A reunião dessas pessoas é que é esse milagre. Por que se encontram? Por que são daquele jeito? Esse encontro e esse jeito é que não pode ser explicado só como um mero acaso.

@ Ocorre que a partir dai, você (me incluo nessa) passa a imaginar que o mundo é assim, da sua maneira, e o resto é caretice. Quando descobre que os caretas estão em maior número, sua reação é achar bom. Tenta, a todo custo, manter o estilo longe de contaminações patricinhas, longe do axé e da Vila Olímpia. O lugarzinho onde mora diz tudo: sofazinho carmim – nos casos mais graves, almofadas no chão -, fotos PB de gente como Paul Bowles ou e. e. cummings, discos de Bezerra da Silva e Mahler. Essa é a parte deliciosa da vida.

@ Há a ruim também. O tempo passa e aos poucos você começa a ter uma vida mais ou menos entrelaçada com o universo careta, porque é lá que trabalha, estuda ou simplesmente freqüenta a padaria. A turma continua a mesma. Só que agora está assustada com o mundo exterior porque lá existem muitas regras e convenções e ela não foi treinada pra isso. Acha absolutamente normal ser assim. Os outros não acham.

@ Por isso, é aquela história: o emprego formal deixa de ter valor, serve apenas como fonte precária de sustento, e você perambula por ai com profissões anunciadas de atriz a produtora de vídeos - duas atividades que inflacionam as noites desta cidade e que não rendem nada no final do mês. Outra alternativa é ser gestora de mídias sociais – um nome bonito para tuiteira de terceiros. Com raríssimas exceções, essas turmas sempre trazem em sua bagagem um terço de meninas envolvidas – pelo menos emocionalmente - com a chamada produção audiovisual.

@ Ai corta-se abruptamente para os dias de hoje e você está diante do computador, com uma garrafa de vodka de um lado, o baseado do outro, e uma pergunta que não lhe sai da cabeça: por que eu sou assim? A pergunta, sem resposta, anda com você dia e noite e de repente você e aquela pergunta são uma coisa só. A convivência torna os dois animais muito íntimos e essa junção vira seu símbolo e o de sua roda de amigos íntimos.

@ A situação é confortável, mas tem seu preço. Como nem o almoço na casa da mãe é grátis, é preciso manter a vida funcionando e para mantê-la, mesmo à base de miojo, é preciso dinheiro. Assim, mais dia menos dia, você desemboca em um trabalho chato – o lado hostil deste folhetim. Trabalhar numa empresa, com expediente, como estou cansada de repetir aqui, é um beco sem saída: ou você adere a eles, o que quase significa assumir outra identidade e virar uma mulher-vagem como no filme “Invasores de corpos”; ou fica do seu modinho alternativo e acaba demitida, prestes a morrer de fome. A escolha certa, naquele momento, é a segunda opção. Claro.

@ Mas de repente, a turma some. Você está sozinha, apenas com a herança cultural daqueles tempos. Vive no difícil equilíbrio entre a loucura e a formalidade. Alguns amigos passaram para o outro lado, via concurso público ou outro tipo de cooptação; Você está no limbo, tentando sobreviver como free-lancer de qualquer natureza: posou nua pra pintor, trabalhou em loja do Shopping no fim do ano, fez figuração em comercial e até pesquisou pro Datafolha. O meu caso foi mais sério: malhei até em sex shop e em projetos de incentivo à cultura. O resultado é que os 30 anos chegam, apontando para os 40, e você nem mais pergunta por que é assim. Você pergunta: o que é que eu faço agora?

@_lulafalcao

2 comentários:

renata disse...

adorei!
o que é que eu faço agora?

Lula Falcão disse...

Obrigado, Renata. Amanhã ou segunda-feira tem mais.
bjs

Postar um comentário