domingo, 31 de julho de 2011

Gente

Maria José tinha uma péssima mania: organizar festas e jantares para convidados que não se davam uns com os outros. Alguns eram inimigos ferozes entre si. Desde criança gostava de provocar constrangimentos e quando virou adulta tornou-se quase uma promoter de eventos com essa característica. O mal-estar geral era sua principal fonte de prazer, talvez o único, mas os convivas também tinham culpa no cartório, especialmente aqueles que repetiam a dose. Anteviam saias justas, cumprimentos falsos, olhares de desprezo e até barracos. Mas iam sempre.

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Adriano não dorme há três anos. Andou em médicos e nenhum soube explicar o que aconteceu com ele, naquele sábado, quando se deitou e não conseguiu pegar no sono. A partir de então são 1.095 dias de insônia. Tomou os mais potentes soníferos e ansiolíticos, mas continua acordado, pesquisando sobre a provável doença. Talvez seja má-formação de Chiari, uma coisa rara, mas ninguém tem certeza. Passa as madrugadas escrevendo versões de seu último sonho, com diversos desfechos. Muda os personagens.

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Rita também tem uma doença rara. Dez anos de seu passado foram apagados. Nenhuma lembrança. Nada. Mas não lhes fazem falta. Está mais jovem e agora não precisa carregar o peso daquela década pelo resto da vida. Foi um tempo difícil.

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Quando tinha 12 anos Roberto resolveu ser crítico de cinema. Enquanto os garotos de sua idade sonhavam com profissões habituais – jogador de futebol e astronauta -, ele lia Cahiers du Cinema. Hoje é gerente de uma concessionária de automóveis. Gosta de filmes de ações. No DVD.

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