quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Esperando Adélia ou não




Tanta ansiedade nesses dias de sua ausência, Adélia, nem você imagina. Aliás, imagina. Basta pensar em minha agonia elevada a uma potência cósmica, andando de lá e para cá dentro de casa, cada vez mais rápido, tentando encurtar o tempo que resta para sua volta. Pensei que faltava uma semana; faltam duas. Pensei que iria suportar; está difícil. Às vezes ouço sua voz, mas é a TV. Às vezes ouço seus passos na sala; é a imaginação ansiosa e transtornada.

Os remédios para dormir não fazem mais efeito e quando fazem, só um pouco, desfazem o sono quando estiro a mão para o lado esquerdo da cama e você não está comigo. Sempre fui assim, qualquer espera me consome, você sabe, mas agora estou tomado por movimentos involuntários. Enquanto penso em você, o corpo realiza operações desnecessárias e obsessivas. Outro dia me descobri na esquina sem notar que tinha saído de casa.  Tento reduzir o tamanho dos dias. Só que eles parecem mais longos.

Sua primeira viagem a negócios. Bom para você, péssimo para mim. Mas não quero atrapalhar, embora não consiga deixar de pensar em você em todos os momentos, num sentimento indeterminado entre saudade e desespero. Falar nisso estive duas vezes no hospital, emergência, pensei que ia morrer. Perdi o mundo de vista, me vi encaixotado e depois apaguei. Os médicos passaram mais remédios para reduzir a ansiedade e o pânico.

Para você preocupar-se é mais uma preocupação, tudo parece OK. Desculpe-me, então, por insistir nesses termos, mas é uma maneira de passar o tempo até a sua volta. Ando confuso e por isso confiro esse mal-estar à sua ausência e pode não ser isso. Vivo em pensamentos tolos, remoendo coisas antigos, como por exemplo o dia em que me vi sem Deus e perguntei e agora, o que será de mim?

Eu sei, nada disso perturba seu jeito de encarar o mundo, sem dramas, sem os fantasmas inexistentes que enfrento dia e noite, numa guerra constante em que já perdi a maioria das batalhas. É o que mais admiro em você - ser diferente de mim em quase todos os aspectos. 

Como estou escrevendo agora, sujeito a mudanças de opinião, deixo aqui também uma dúvida: caso você seja a causa do meu desespero por que devo esperá-la com tanta ganância? Não seria melhor esquece-la? Você é a causa ou conseqüência do meu drama? Enfim, posso estar apenas doente, sendo a paixão  um sintoma, que pode combatido com medicamentos e álcool. O problema é o que provoca tudo isso. Talvez não seja você,  e caso seja não seria aconselhável trazer para perto alguém cuja ausência detona tanto desordenamento. 


Pensando bem, Adélia, acho melhor você não voltar

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